domingo, setembro 28, 2008

Para ti, palavras de antes e de hoje

Também o tempo.
E o mar invadindo a praia. Saltando sobre a falésia. Namorando descaradamente a noite.
Claro que te desejei.
No fim.
E a floresta que o meu desejo construiu existe num estranho e longínquo país sem grandes ambições mas com árvores-de-mar em todos os jardins.
E estou cheia de ti.
E interrogo-me sobre a razão desta invasão. E percorro todos os caminhos por nós habitados numa fracção de noite. Atrevo-me mesmo em todos os fascínios. Ignoro todas as tabuadas que nos deram. Aos costumes digo merda sem ambiguidades.
Assim o mundo.
A continuação dos dias nevoeiro nesta vila meridional. O saber de ti como pão para a boca. E a invasão do medo. O despertar de sentimentos há muito esquecidos na minha quotidiana permanência.
E só agora reparo como tudo é estranho.
É uma paisagem de animais marinhos petrificados no meio de todos os naufrágios sob um sol ardente de desejo.
É a pedra que queria remover.
É o ter-te e não saber-te muito embora todas as cidades estejam abertas ao amor.
É o inventar de palavras novas. O perceber de todas as conversas. O esquecimento de mim. Dos outros. O nascer da água em todos os oásis do meu corpo.
E por isso quero agora um tempo sem dividendos.
Assim a noite, o silêncio aberto pela tua ausência ou pelas verdades que me deixas.
Assim o estar sòzinha como uma Deusa e como uma Deusa reconstruir-te enquanto o mar permanece no fundo da minha história.
Assim todas as vitórias e derrotas rebentando agora na minha memória de mulher-animal adulto.
E são mais as derrotas. As ausências. Apesar do sorriso. Da poesia rasgando a indiferença.
As palavras. E tu.
A armadilha da imensa sabedoria dos mais velhos.
E abraço o nascer do sol com o teu nome brincando com a rebeldia das ondas.
E sei do amor nesta estrada aberta mais à raiva do que ao sonho.
Navegar.
Abrir contigo as velas deste barco e literalmente esquecer-me desta sociedade codificada na mentira.
Navegar.
Por um minuto que seja.
Por um sorriso que te nasça no seio desta multidão indiferente.
As palavras como facas.
E falei das pedras. Dos rios. Das mulheres. Das tuas mãos a qualquer hora. E por isso respirei a alegria dos jovens animais.
Então o relógio pára. E não só ele.
Abertas todas as interrogações sobre ti.
E todos os rituais.
E quando a cidade perguntou o teu nome apenas respondi que te chamavas homem.
Assim não irão inquisidores ao dicionário saber da tua medida, e o que é mais grave, do teu sabor.
Mas não poderemos esquecer que haverão outras cidades. Outros homens, outras mulheres. E outros velhos e velhas.
E todos eles ao saber de nós gritarão de escândalo e masturbar-se-ão na sua vulnerabilidade de animais às portas do inverno.
E os donos de todas as catedrais continuarão a alimentar-se dos ingénuos, a transformar os glaciares em nojo.
Apesar de tudo aqui estarei.
E a minha cidade não terá norte nem sul, nem mentiras em todas as estátuas.
Todos os textos falarão de amor como de todos os degelos.
Todas as mãos serão possíveis.
E ficarei na planície à tua espera, naturalmente, para haver cidade de habitar.

1 comentário:

Anónimo disse...

o teu melhor texto de sempre